terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Um dia no passado

os meus patins


Escrito em 15/05/2006(pequenas alterações feitas hoje)

Levantei-me às 5h30m da manha, a luz já entrava de mansinho pela janela, olhei para a rua, o sol estava a nascer, lindo como sempre (tal e qual como eu me lembrava). Como ontem a chuva fez uma visita, as rãs nas enormes poças de água, inventaram uma música maluca que cantavam desenfreadamente, por cima da minha cabeça um mosquito resolveu acompanhá-las e zumbia feito louco dentro do quarto. Por momentos, pensei reclamar por causa do barulho mas depois acabei por sorrir, fechar os olhos e adormecer, afinal eu estava com saudades de todos estes sons. Acordei às 7 horas, levantei-me rapidamente e tomei banho de água fria (o esquentador estava lá como sempre esteve mas também desta vez não era necessário...banho de água fria é mais fixe) lavei o cabelo e passei-o por água e vinagre para ficar macio e brilhante (sim porque o amaciador é coisa que nesta época ainda não foi inventada). Ao mata-bicho, comi pão comprado no depósito de pão em frente à Defesa Civil , leitinho delicioso vindo da vacaria e toca a andar a caminho da paragem do 22. Bata branca como se tivesse sido lavada com Skip mas que foi apenas lavada com sabão e esteve a corar depois da famosa sabonária quente da minha mãe (tão famosa e perfumada como as das outras mães). Na bata, vaidoso e triunfante bailava o emblema do LGL. A pouco e pouco outras batas foram chegando e a mistura das cores dos emblemas deram alegria à paragem, à rua, ao bairro, à cidade. Os príncipes encantados, cheios de estilo na passada chegaram também e com olhares atrevidos faziam comentários do tipo "abençoadas mães de tão bonitas filhas"e coisas ainda mais parvas mas que nos fizeram rir. Não sei como é que conseguimos entrar todos no maximbas, por momentos deixei de ver o Guimas, devia estar a apanhar alguma caneta que caiu aos pés da Cacilda, rapariga linda que põe os rapazes de cabeça às voltas. Chegamos à paragem em frente à 7ª esquadra, livra, entrou mais gente, socorro quero outro banho já (e também um frasquinho de perfume para atirar ao ar) depois de muitos encontões, risadas e amassos, finalmente o liceu. Motas que cantavam, mil borrachos lindos de morrer, carros, gargalhadas, batas misturadas em danças de beijos  com camisas cintadas, pancos de salto alto e calças à boca de sino, tudo no portão da entrada do liceu. De repente admirada vi “ninos” do bairro, o Vitor e o Virgílio cheios de banga. Perguntei ao Virgílio como pensava chegar ao Salvador Correia a tempo da primeira aula e ele respondeu que tinha borla de horário, o menino Vitinho, com a maior das latas disse com ar solene "hoje fuguei na escola"...eu como não podia faltar nem tinha borla ao 1º tempo tive que ir para as aulas. Aulas...aulas...mais aulas...finalmente hora d regressar a casa, nem queria acreditar...na paragem do maximbombo 22 estavam mais de 20 pessoas, chegou o maximbas e só levou 3 pessoas, 15 minutos depois outro maximbas e só 5 pessoas, quando pensava que só ia chegar a casa no dia seguinte lá veio um que me levou para casa. Entrei na minha rua e vi logo a minha vizinha Ana em cima de uma andas de madeira que ela estacionava junto da varanda do primeiro andar onde morava, o Jacinto, andava a abrir no carrinho de rolamentos e o meu Cajueiro como sempre esperava por mim à porta de casa. A Ana convidou-me para ir dar uma volta com ela, respondi que sim mas só depois do almoço. Às 3 horas fizemos um belo par, ela numas andas gigantes e eu de patins, compramos um pirolito e depois de algumas voltas e conversas com arcos, papagaios de papel, macacas, bolas de cilck clack, barra do lenço, dá-me fogo, escondidas e jogos do elástico, voltamos para casa, Estava na hora de fazer os trabalhos de casa e depois jantar, ficou combinado que voltaria mais um “cochito” antes de dormir na hora de “ flitar” a casa. Com os trabalhos já feitos e antes do jantar, sentei-me no muro, a trincar um “cadidito” de cana-de-açúcar, aquela do suco doce que nos faz ir até às nuvens. Enquanto mordiscava a cana, ia mexendo o corpo ao som do majuba que tocava em casa do Armelim. Senti-me feliz e nem os dois mosquitos que me tentavam picar me conseguiram irritar. A minha mãe mandou-me pôr a mesa e fomos jantar, era dia de quinino mas até esse desgraçado, me soube bem. O jantar estava bom mas o mamão acabadinho de apanhar do mamoeiro estava divinal. Ouvi a Luísa chamar por mim, fiz beicinho e pedi à minha mãe para me deixar ir lá para fora um “cochito”, ela olhou para mim de cara torcida mas acabou por m dizer que sim. Na rua a animação era grande, já lá estavam a Letinha, o Ventura, o Joao o Ze Antunes, o Nando,o Domingos, o Carlitos Antunes, o Virgílio, o Policas, o Nelo, o Vitinho o Arnaldo a Menita a Celucha o Toringa a Luísa, o Albano, a São e o Helder. O Armelim continuava a pôr música em casa (devia estar apaixonado e quando isso acontece, deita-se no chão, debaixo do gira-discos e fica horas a ouvir música enquanto sonha) ficámos ali a conversar embalados pelas canções do Roberto Carlos, nem demos pelas horas mas a verdade é que já era tarde e as mães começaram a chamar-nos, apesar de contrariados e de vários pedidos para ficarmos mais um pouco, tivemos mesmo que ir para a cama. Deitei-me, apaguei a luz, fechei os olhos e quase imediatamente adormeci, estava cansada. Acordei às 5h30m da manha...estava frio...levantei-me...tudo escuro e silencioso...não queria acreditar...aquela não era a minha janela...aquele não era o meu quarto...aquela não era a minha casa...aquele cheiro que eu amava já não se sentia no ar...já não estava a pisar o chão da minha terra adorada...tudo tinha mudado...teria sido apenas um sonho? Não! Não foi um sonho. Eu estive lá, com os meus vizinhos antigos e com os meus vizinhos novos todos juntos...foi lindo e quero repetir.



2 comentários:

Letinha disse...

Nixa....

Quando voltares a repetir...leva-me contigo!

Eu também costumo sonhar, só que misturo tudo...
Bairro Popular, Cine S. João, Maximbas 22, Ferroviário de Angola, Cine Kipaka, Liceu e Magistério, Rua da Gabela e Cor. Artur de Paiva...

Daí que vou precisar da tua ajuda para não me "perder"!

Letinha

São Matos disse...

E eu também quero! Só que eu vou para o Liceu Salvador correia e o bairro é o Salazar.Fiquei muita vez apeada,porque não havia lugar e depois tinha que ir a pé! Chegava a casa esganada de fome e com tanto calor que me metia logo debaixo do chuveiro.

Mas se me levares contigo,prometo que apanho o 22 e vou conhecer os borrachos do teu Bairro,o Popular.

Adorei o texto.Senti-me lá outra vez, no liceu.